No fundo do armário

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007
Artesanato de Antonio de Castro

É engraçado quando você descobre que nem todas as atenções estão viradas para o seu segredo. Típico de mim achar que estão a todo o momento me observando, querendo saber um pouco mais sobre a minha vida pessoal.

É como se todo mundo na verdade já soubesse que eu sou gay, mas insistem em manter as conversas sobre o assunto nos momentos em que eu estou bem distante, ou pelo menos o suficiente para não ouvir.

De repente você descobre que não é de você e dos seus trejeitos às vezes estranhos de que as pessoas falam pelos cantos nos corredores, que não é você o homossexual escolhido pela massa para averiguar a verdade pesquisando a vida pessoal pelo orkut, fussando comunidades e amigos, analisando as fotos para ver se há algo que dê ainda mais pinta.

Meu amigo hetero foi surpreendido por mim duas vezes, conversando em volume baixo com uma outra colega, no fim do expediente. Apesar de ela deixar claro que eu não poderia saber sobre o que eles falavam, no metrô, ele não se segurou me contou que um de nossos colegas de trabalho e seu amigo, recém chegado à firma, poderiam ser gays.

Argumentou dizendo que a namorada desse nosso colega nunca fora vista por ninguém, que era muito estranho que o novato morasse no mesmo prédio que ele dizia morar sua namorada e mais estranho ainda o fato de a história do novato, sobre a qual meu amigo hetero não entrou em detalhes, ser bem parecida com a do nosso colega.

Pode ser egoísmo da minha parte, mas é um alívio saber que não conversam sobre mim, nem tentam descobrir se eu sou gay. Fico com medo de um dia sucumbir e acabar deixando claro. Isso me prejudicaria muito, até profissionalmente. Meus chefes me veriam a partir de então com outros olhos.

Mas eu não estava no centro do redemoinho, nem eu meu ex-namorado. Estamos a salvo, pelo menos por enquanto. Agora mesmo eu estava pesquisando o orkut do novato e descobrindo várias tendências à bissexualidade. Comunidades de diva do pop, paixão por personagens femininos ou mais frágeis de mangar (é assim que se escreve?), além de um depoimento do colega em questão bem comprometedor, falando sobre “te per turbo 24 horas”.

Enfim, isso não é problema meu, mas me deixa feliz saber que ainda estou bem fundo no armário e que surgira um motivo para meu amigo hetero conversar comigo. Ou talvez seja mesmo ruim, tentando desvendar os segredos dos outros, semelhantes aos meus que eu não imagino desvendados.

Afinal de contas, há algumas semanas atrás, andando pelo orkut, descobri que meu amigo de infância era gay, que tinha assumido de algum modo, pois sua página estava repleta de recados trocando carinhos e flertes com outros homens, que tinham comunidades gays do tipo que têm links para fotos e vídeos pornográficos. Além disso, achei scraps dele para homens que contavam histórias realmente excitantes em comunidades gays, pedindo para ser adicionado no MSN pois queria conversar e ver no que dá.

Fiquei com um pouco de inveja e mais, com um pouco de raiva. Por que quando estudávamos juntos ele nunca tentara nada comigo, por que não arriscara alguma mão em um lugar proibido nas tardes que passávamos juntos em seu quarto, quando víamos aqueles vídeos de sexo gravados por seu irmão mais velho?

Por quê?

Talvez as coisas tivessem acontecido de uma maneira mais natural em minha vida, talvez eu pudesse estar mais certo do que eu sou se eu tivesse começado isso naquela época e hoje eu seria bem mais resolvido.

Mas ele não tentou nada e se tornou um homossexual corajoso. Com cara o bastante para não apagar recados e aceitar convites para surubas teens que ocorrem em boates gls que ele freqüenta. Não sei se eu queria ser assim, ter uma vida promíscua, mas poderia ser bom fazer as coisas sem pensar em conseqüências ou princípios a serem seguidos.

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