Capítulo Quatro

quarta-feira, 21 de novembro de 2007
Artesanato de Antonio de Castro

A manhã estava fria e chuvosa quando acordou, em sua cama. A casa escura, todos dormiam. Era hora de começar mais um dia, mais um que não sabia como terminaria, que rumo tomaria. Por quais buracos passaria nas próximas dezenove horas.
Sim, dezenove. Era como se seu dia tivesse dezenove horas. As horas de sono eram inúteis se nada podia ser resolvido naqueles momentos em que fazia um ritual silencioso com algo tão superior e puro: o descanso.
Cansado era a palavra que lhe resumia naquela manhã. Cansado de pensar. A noite inteira praticamente tinha sido dedicada àquela missão. Pensar no que tinha ocorrido.
Não sentia fome, não sentia sono. Era só ansiedade, uma ansiedade incontrolável. A vontade de falar era tão absurda que se via falando sozinho, que começava a pensar se não estava mais uma vez tendo um de seus devaneios.
Tendo a hipótese de tudo não ter passado de fruto da sua imaginação da qual tinha provas ser bem fértil, ao chegar no jornal e se deparar com Dan, no loby, como se estivesse esperando alguém, cumprimentou-o com um seco bom-dia e entrou no elevador que estava aberto e quase vazio.
Dan entrou em seguida, o rosto sem nenhuma frustração, como se nada tivesse acontecido, dando a Joaquim mais certeza de que estava louco. Aos poucos as pessoas foram saindo do elevador, até chegarem ao oitavo andar, onde normalmente saíriam, onde Dan fez questão de segurar seu braço discretamente.
Pararam em mais três andares, onde saíram as cinco pessoas que ainda estavam no elevador e, entre o décimo terceiro e o décimo quarto andares, Dan apertou um botão para parar o elevador.
- Eu precisava fazer isso – disse sério, bem mais sério do que estava nos últimos dias.
- Tudo bem – Joaquim suspirou apreensivo – Você quer falar alguma coisa comigo?
- Você ficou com raiva por ontem? - perguntou.
- Não – Joaquim disse, sentindo-se aliviado por não estar delirando.
- Desde a primeira que eu vi você, eu sabia que você era gay.
- Mas eu não sou, quer dizer, eu não sabia que era.
Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos.
- Não?
- Não - Joaquim respondeu.
- Então, desculpa – Dan falou olhando para os próprios pés – Eu pensei que você fosse...
- Você é? - Joaquim perguntou.
Mais uma vez o silêncio falou pelos dois ou não falou. Não sabia porque estava levando a conversa daquele jeito, porque ambos estavam na defensiva, calculando meticulosamente as palavras para depois falá-las.
- Agora eu acho que sou – Dan disse enfim.
- Agora? - perguntou olhando nos olhos castanhos de Dan – Só agora?
- É, eu nunca tinha feito isso, quer dizer, foi a primeira vez que eu me arrisquei.
- Muito corajoso.
- Você nunca faria?
- Não. Nunca.
E nem tinha terminado de dizer a palavra quando sentiu as mãos de Dan novamente em seus braços, seus dedos compridos passando pelo tecido de sua camisa de um jeito tranquilizador, começando pelos ombros e descendo até as mãos.
- Foi muito bom, sabia? – Dan disse olhando-o como se estivesse olhando para uma mulher.
Suas mãos agora estavam envolvidas nas mãos de Dan e os corpos se aproximavam mais e mais. De repente já estava de costas para Dan, sentindo toda a excitção daquele homem alí tão próximo. Estava feliz por estar vivendo aquilo, sentindo uma satisfação sem nome nem descrição.
Ao mesmo tempo era uma vergonha, como se ele estivesse deixando ser usado por Dan que se aproveitava de todo aquele estranho desejo, rindo dele como todos riram esse tempo todo. Como se Joaquim fosse brinquedo, objeto descartável na mão de mais uma pessoa que sabia perceber fraquezas e vontades.
Mais estava tão bom, tão diferente de tudo o que vivera até então e tão parecido com o que tinha idealizado nos últimos anos, quando idealizar se tornara o mais próximo de sexo que chegara e a que se permitia chegar.
Só ao deixar aquele homem descer suas mãos por seus braços, tocar sua bunda de um jeito excitante e colocar as mãos dentro de suas roupas, envolvendo seu pênis vivo, só isso fazia com que Joaquim se sentisse ainda mais vulnerável a tudo ao redor, como se a qualquer momento fosse cair de tanto que suas pernas tremiam. E que ao cair, Dan, o homem que lhe proporcionara tanto prazer em tão pouco tempo, riria dele. De quão patético era. De quão inexperiente era.
Os olhos fechados, todos os pêlos da nuca arrepiados, o sopro já tão típico de Dan no pescoço, seguido dos lábios e de repente suas mãos abriram a calça dele.
Joaquim se virou novamente de frente para Dan e olhou cada movimento seu ao abrir o botão e o zíper da calça do outro. Queria ver tudo, queria ver o pênis enrigecido que sentia pressionar em sua bunda, queria tocá-lo.
E lá estava ele. O momento que imaginara esse tempo todo, o momento em que estaria com um outro homem e que tocaria um outro pênis. Não controlou o susto que era mais como uma adimiração pelo momento que pensara nunca chegar.
Seus olhos se abriram e as mãos tomaram uma vida elétrica segurando-o com força e prazer, um prazer sobre-humano. A empolgação foi tanta que Dan se assustou e deve até ter sentido alguma dor, tamanha ferocidade de Joaquim ao segurar aquele objeto de prazer que pela primeira vez tinha alí na sua frente a sua disposição.
- A gente tem que ir – disse Dan.
Só então se lembrou que estavam no elevador parado entre o décimo terceiro e o décimo quarto andares, atrasados para o trabalho.
Se vestiu e observou Dan se vestir. Fiacaram em silêncio, o que seria marca daquela relação que nascia alí. Olhando um para o outro como se tentassem descobrir o que estavam pensando quando não pensavam em nada, ambos. Esforçavam-se para não pensarem em nada, pois se pensassem poderia ser o fim daquela alegria estranha.
Saíram do elevador no oitavo andar e entraram na redação que já estava cheia. Cada um foi para sua estação de trabalho, ligaram seus computadores e começaram mais um dia de trabalho.

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