De novo

Chegou o dia da tão esperada prova. Daquelas minhas provas preferidas. Eu não sabia tudo, tive que raciocinar e exercer minha escrita. Escrever me deixa cansado mas me deixa feliz. Feliz, como se aquele cansaço fosse fruto de algo muito bom, como cansaço de sexo.

O trabalho foi tudo bem. Peguei o metrô bem cedo, depois de longas duas semanas direto indo de carro com meu amigo hetero. Parecia que eu nem sabia mais ir para o trabalho de metrô. Mas eu fui.

Hoje eu fiquei em treinamento o dia inteiro. No fim do dia o treinamento juntou na mesma sala eu e meu ex-namorado. Foram duas horas e meia de pura tortura.

Desde que ele voltou de férias, sem nem olhar no meu rosto direito, eu já havia percebido que algo tinha mudado. Só não sabia que o que tinha mudado não tinha nada a ver com a nossa “relação”. Que o que tinha mudado era ele.

Uma de nossas amigas chegou hoje me dizendo que ontem meu ex-namorado havia ido a um forró. Não seria nada se fosse um lugar aceitável, mas pelo que ela disse, pelo que ela descreveu o local, era algo bem baixo nível.

De repente eu fiquei me perguntando se nós ainda estivéssemos namorando eu acharia normal programas desse tipo ou se ele teria vontade de ir a lugares ruins. Também não posso falar que foi ruim, ele pode ter se divertido na companhia de pessoas legais, mas...

Não é só isso. Hoje, com o treinamento, eu pude ficar mais tempo perto dele e perceber como ele tem agido de maneira diferente. Está mais brincalhão, mas um brincalhão bobo. Falando alto, rindo alto, falando coisas bobas e sem sentido. Como se quisesse mostrar para alguém como ele estava bem. Depois paro para pensar e percebo que pode ser muita soberba minha achar que ainda sou tão importante para a ponto disso.

E deixo para lá, pensando no quanto as coisas mudaram, na conversa que ele disse que teria que ter comigo ontem e que não teve. Também não vou procurar essa conversa. Tenho medo de ser algo que não quero escutar. No fundo prefiro essa situação seca. Ele não soube lidar com a separação e estragou tudo. No fundo é isso que acho, criando um clima chato no trabalho, que todos percebiam.

Agora pelo menos ele vive a vida dele, faz as piadas dele em alto e bom tom, canta de modo forçado, como todas as outras coisas que não é típico dele, mas que ele tem feito com certa freqüência.

Esqueço. E lembro de novo da prova e do quanto não consegui estudar para a prova. Pego o livro, ainda no trabalho, em horário escondido, mas não me concentro. A hora passa enquanto me distraio numa conversa engraçada com meu amigo hetero, depois com uma amiga e no fim já está na hora de ir embora e ir para a faculdade. Para a prova.

Enquanto me pergunto como falar do modelo atômico de Dalton e do que é inconsistente com o modelo moderno, minha concentração é desviada para a porta. Já estava na hora, seis e meia. A segunda questão ainda nem fora lida por mim e o novo rapaz já entrava mais uma vez atrasado.

Desde o primeiro dia de aula dessa matéria eu já havia reparado nele e sentia que ele também em mim. Ele me olhava e eu fingia nem vê-lo, daquele jeito para o qual me esforço para ter paciência de só olhar para a pessoa quando ela não estiver olhando mas estar sempre atento se os olhos da pessoa estão te vendo. Enfim...os olhos dele estavam sempre me vendo desde o primeiro dia de aula.

Desde o primeiro dia de aula queria arranjar um motivo para falar com ele. Hoje, infelizmente, não houve a oportunidade de falar, como tem ocorrido todos esses dias. Eu acabei a prova e fui para casa, fazer mais um trabalho para amanhã, mais um que eu devia ter feito durante aquele que foi o feriado menos produtivo da minha vida.