Desaparecido

Domingo ele me deixou em casa no início da noite. Eu estava feliz. Tínhamos passado um final de semana tranqüilo, mas ainda assim um final de semana bom, daqueles que se conversa tomando café o dia todo, daqueles que se toma banho depois de um transa boa para ir ao cinema.

E terminou domingo. Da minha casa ele ia direto para Cabo Frio, reencontrar os amigos do carnaval. Só então descobri que esses amigos moravam em Cabo Frio, não eram férias.

Segunda passou, terça, quarta, quinta e hoje fazem exatamente cinco dias desde que o vi pela última vez, desde que ouvi sua voz, desde que meu celular tocou mostrando seu nome no display.

Por dois dias achei que fosse coisa da viagem e preferi não ficar remoendo aquilo. Na quarta cheguei à conclusão de que ele ainda era o mesmo aventureiro de sempre. A conversa de ter um emprego, um apartamento agora parecia nada mais que conversa. Talvez ele já tenha até encontrado algo mais interessante nesses dias. Alguém.

E eu fiquei com raiva. Senti a raiva crescer em mim em todos os momentos em que pensava na sujeira que ele estava fazendo comigo. Ele me conheceu, a gente ficou, ele me prometeu milhões de coisas nas quais não acreditei. Mas ele cumpriu as mais difíceis de serem cumpridas e de repente eu estava com uma pessoa que queria morar comigo.

Eu relutei por muito tempo. Eu queria curtir, eu ouvi as pessoas, eu lembrei de como era difícil estar sozinho e de como era bom estar com ele. Eu dei o braço a torcer. Eu estava começando a querer me apaixonar. Eu passei o fim de semana todo transando e conversando e bebendo café e vendo filmes dramáticos e conversando e transando mais.

Eu não vi ninguém que não fosse ele por dois dias, eu me entreguei e gostei.

Mas ele sumiu. Milhões de desculpas surgiram na minha mente para explicar esse sumiço repentino dele. O celular poderia ter descarregado, até mesmo poderia ter estragado na água do mar. Mas outras pessoas teriam telefone nesse lugar e ele já sabia meu telefone de cor.

Ele poderia ser um canalha, se encantado com a presença dos amigos e saído para curtir a liberdade. Poderia ter mudado de idéia, talvez alguém mais bonito como eu sempre previ. Só não imaginava que aconteceria tão rápido.

Ele poderia ter tentado ligar varias vezes e não ter conseguido por algum problema de sinal telefônico. Mas quando cheguei nesse ponto, vi que era inútil ficar achando motivos. E desisti. Desisti de pensar nisso também, mas toda hora parecia que as pessoas ao meu redor davam a deixa para eu me desabafar.

Ontem eu desabafei. Com mais de uma pessoa falei sobre isso. E quando percebi que ainda havia a hipótese de ter acontecido alguma coisa decidi ligar. Ia esperar ate hoje, mas foi mais forte que eu. Eram duas da manhã quando estava no telefone ouvindo a chamada do outro lado.

Ele atendeu depois de muito tempo, numa festa de uma amiga de um amigo ou coisa parecida. Ele disse que estava com saudades, como se eu fosse um amigo que não via há algum tempo, mas agiu como se não tivesse passado cinco dias desde o nosso último contato numa época em que ele não ficava mais de cinco horas sem me mandar uma mensagem de texto no celular ou me ligar.

Ele disse que voltava para o Rio no sábado e que queria muito que a gente saísse para ele me apresentar um amigo dele que estava vindo dividir apartamento com ele aqui no Rio. Cara muito legal e boa pinta (palavras dele).

This silence sits easy
So peacefully

Na hora eu não vi problema, mas agora, refletindo, talvez eu tenha problemas. E só lamento porque fui eu quem permitiu que o potencial problema surgisse. Fui eu que me esforcei para me envolver com alguém que nem conhecia.

Ouvindo: Little Favours – KT Tunstall